Dom Erwin denuncia crime contra povos do Tapajós
Dom Erwin: “Governo Federal comete
crime contra povos do Tapajós”
Uma caravana de ambientalistas realizou um protesto,
no último fim de semana, na Comunidade de São Luiz, no Município de Itaituba,
Oeste do Pará, em defesa do rio Tapajós. Os ambientalistas são contra a
construção de uma usina hidrelétrica na Cachoeira de São Luiz do Tapajós.
O ato público liderado pelo movimento “Tapajós Vivo”,
reuniu mais de 1 mil pessoas de diversas localidades, assim como ambientalistas
de outros países, como os Estados Unidos.
Participaram do protesto ativistas de Santarém, Altamira,
Itaituba, Aveiro, das aldeias do alto e médio Tapajós e do rio Tapajós, além do
Xingú e do Mato Grosso.
Estiveram presentes, também, representantes do
Ministério Público Federal (MPF); o bispo de Santarém, Dom Flávio Giovenale; o
bispo de Itaituba, dom Wilmar Santin e o bispo do Xingu, Dom Erwin Kräutler.
Dom Erwin Kräutler acusou o governo federal de cometer
crime contra o povo do Tapajós.
“O nosso povo não foi consultado. Tomam-se
iniciativas, tomam-se decisões em Brasília, no Sudeste ou no Sul do País, e não
se consulta o povo da Amazônia. São 24 milhões de seres humanos que estão aqui
na Amazônia. Não existe, são apenas números de estatísticas, isso nós não
podemos admitir. Eu acuso o governo de usar a estratégia do rolo compressor, a
estratégia do fato consumado. Não se pergunta nada a ninguém, se coloca o povo
diante de um fato consumado. Ora, isso é intragável, inaceitável”, disparou o
religioso. No final do manifesto foi lido um documento oficial que será
encaminhado para a Presidência da República.
São Luiz do Tapajós recebeu a imprensa de São Paulo,
Rio de Janeiro, Fortaleza, Santarém, Itaituba e ainda jornalistas
internacionais. Lideranças Munduruku, movimentos sociais e organizações como o
Greenpeace, a Fase, e o Cimi também participaram do ato.
COMPLEXO HIDRLÉTRICO: De acordo com o Ministério de Minas
e Energia, integra o projeto do Complexo Hidrelétrico do Tapajós, também pelos
aproveitamentos as usinas de Jatobá (2338 MW), Jamanxim (881 MW), Cachoeira do Caí (802
MW) e Cachoeira dos Patos (528 MW),
todos em estudos, além de outros dois aproveitamentos inventariados: Chocorão
(3336 MW) e Jardim do Ouro (227 MW).
A capacidade instalada da São Luiz do Tapajós foi elevada de 6133 MW para
8040 MW no Estudo de Viabilidade Técnica-Econômica da barragem.
Segundo o Ministério de Minas e Energia os municípios
atingidos diretamente serão Itaituba e Trairão, no Pará. O governo Federal
prevê a entrada em operação da usina em 2016.
Já a empresa responsável pela obra será a Eletronorte
(Centrais Elétricas do Norte do Brasil S/A), que é uma estatal federal
controlada pelas Centrais Elétricas Brasileiras S/A (Eletrobrás).
O Ministério informou, ainda, que as populações
indígenas afetadas serão as comunidades Munduruku e Apiaká (Terras Indígenas
Pimental, Akaybãe e Remédio), assim como as áreas protegidas afetadas vão ser o
Parque Nacional da Amazônia (9935 hectares), a Floresta Nacional
de Itaituba I (78 hectares) e a Floresta Nacional de Itaituba II (20368
hectares).
IMPACTO AMBIENTAL: Segundo o Ministério Público
Federal, o complexo das cinco usinas da Bacia do Tapajós deverá inundar
cerca de 2 mil km2 de mata, quase duas vezes a extensão da cidade do Rio de
Janeiro. “Do ponto de vista ambiental, não há dúvidas de que o estrago
ambiental de São Luiz e do complexo do Tapajós é ainda superior ao que será
causado por Belo Monte”, diz Felício Pontes Júnior, procurador da
República no Pará.
O instituto de pesquisas Imazon aponta que todas as áreas excluídas das unidades de conservação pelo governo estão no mapa das regiões prioritárias para a conservação da biodiversidade. Cerca de 80% delas são classificadas pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA) como de prioridade “extremamente alta”.
O governo justifica que o projeto é absolutamente imprescindível para garantir a oferta de energia do País e que fará um projeto hidrelétrico revolucionário no coração da Amazônia. A operação para a construção da usina de São Luiz do Tapajós, sustenta Altino Ventura Filho, secretário de Planejamento e Desenvolvimento Energético do Ministério de Minas e Energia (MME), vai se basear no modelo inédito de “usina plataforma”, inspirado nas plataformas de petróleo que ficam isoladas nos oceanos.
MPF QUER SUSPENSÃO DE CONCESSÃO DE FLORESTA EM
ITAITUBA: O Ministério
Público Federal entrou na justiça pedindo a suspensão da concessão da Floresta
Nacional do Crepori, em Itaituba. O MPF argumenta que o processo de licitação
dos recursos florestais escondeu a existência de populações tradicionais e
indígenas vivendo no interior da área e utilizando a floresta. De acordo
com o MPF, há flagrantes irregularidades no plano de manejo elaborado pelo
Instituto Chico Mendes (ICMBio), gestor da Flona. O vencedor do leilão foi a
empresa Brasad’Oc Timber Comércio de Madeiras Ltda.
Quando o edital de licitação da Flona do Crepori foi
divulgado pelo Serviço Florestal Brasileiro (SFB) em maio de 2013, o MPF
identificou a irregularidade no plano de manejo, que mencionava a existência de
pelo menos 213 pessoas morando e utilizando os recursos da área, mas
desconsiderava a presença de possível população tradicional e dos limites entre
a Flona e a Terra Indígena Sawre Muybu, dos Munduruku, em fase de demarcação.
A partir da constatação das irregularidades, o SFB
recebeu recomendação para suspender o processo de licitação, mas respondeu que
não acataria a recomendação. O MPF solicitou perícia sobre a população da área,
coordenada pelo pesquisador Maurício Torres, que já havia feito, a pedido do
ICMBio, uma revisão populacional da área. A revisão mostrava claramente a
existência de população tradicional, mas foi desconsiderada tanto pelo ICMBio
(que não enviou o parecer), quanto pelo SFB. A população ignorada
seguidamente pelo ICMBio e pelo SFB vive no rio das Tropas e, de acordo com a
descrição do perito Maurício Torres, trata-se de “garimpeiros que utilizam
técnicas artesanais de garimpagem manual, de baixo impacto ambiental e de alta
composição de saber patrimonial agregado”.
“A população tradicional deve ser identificada como
beneficiária da unidade, com exceção de uma ocupação cujo perfil não
caracterizava uma posse legitimável à época da criação da UC (unidade de
conservação) que deve ser notificada para saída sem direitos indenizatórios”,
prossegue. A perícia afirmou ao MPF que “o projeto de concessão, tendo em vista
a área licitada, impactaria as comunidades encontradas, uma vez que a atividade
madeireira em suas proximidades afetaria o modo de vida local.”
Mais do que isso, foi possível observar que a área de
uso direto e até de morada desses grupos figura dentro do perímetro a ser
licitado (…) o que tornaria impossível a permanência do grupo na área”. “Há
evidente ocupação do povo Munduruku na área da Flona Crepori, sendo que tais
áreas eram utilizadas em conjunto pela comunidade e pelo povo Munduruku.
O relatório conclui, ainda, que no interior das áreas
licitadas passam igarapés de pesca, trilhas de caça e zonas de coleta. Ademais,
há concentração de aldeias Munduruku na margem esquerda do rio das Tropas, na
divisa com a Flona, a menos de 2 km do megaempreendimento madeireiro, chamando
a atenção, ainda, para ausência de consulta ao povo Munduruku e as demais
comunidades tradicionais, na forma da Convenção 169 da OIT”.
O MPF pediu que a Justiça suspenda imediatamente a
concessão da BrasaD’oc Timber para a realização de um estudo antropológico
complementar que caracterize judicialmente as populações da área. Já são duas
as concessões florestais do SFB que estão sendo investigadas pelo MPF,
recentemente, o leilão das Flonas de Itaituba I e II, que também afeta os
Munduruku e populações tradicionais, foi questionado.
Por: Nazareno Santos
Fonte: RG 15/O Impacto